Em ano eleitoral, o governo propõe novo "Pacote Anticrimes" com mudanças na Lei Antiterrorismo e ampliação da legítima defesa dos agentes de segurança pública; as matérias foram enviadas ao Congresso
Via: Alma Preta
Texto: Thaís Rodrigues | Edição: Nadine Nascimento | Imagem: Marcos Corrêa/Presidência da República
A imagem mostra o presidente Jair Bolsonaro, com o rosto em destaque. Atraz está a bandeira do Brasil.
Foto: Imagem: Marcos Corrêa / Presidência da República / Alma Preta
O presidente da República, Jair Bolsonaro (PL), e o ministro da Justiça e da Segurança Pública, Anderson Torres, entregaram ao Congresso Nacional, projetos de lei do novo "Pacote Anticrime" do governo federal. Uma das medidas, consideradas eleitoreiras para alguns especialistas, adiciona "ações violentas com fins políticos ou ideológicos" à Lei Antiterrorismo. Outra, altera o Código Penal para abrandar penas para policiais que cometem excesso em exercício das suas funções.
Os projetos estão gerando controvérsias entre o poder público, peritos técnicos e sociedade civil. E, de acordo com o coordenador da organização baiana que promove assessoria jurídica popular - IDEAS, Wagner Moreira, as propostas abrem precedentes para criminalização de movimentos populares e cidadãos individuais de diversas formas.
A primeira matéria a ser destacada modifica a Lei 13.260/2016, e amplia a definição de terrorismo. A iniciativa do Palácio do Planalto tira a conotação exclusiva do racismo, do xenofobismo, atualmente em vigor, e passa a prever "o emprego premeditado, reiterado ou não, de ações violentas com fins políticos ou ideológicos".
De acordo com Moreira, em um ano eleitoral, propor um projeto que visa classificar como terrorismo as ações com finalidades político-ideológicas é uma tentativa clara de criminalização de todo e qualquer movimento que faça oposição ao governo vigente.
"É muito perigoso, pois o governo bolsonaro é pautado no ódio e na não aceitação das diferenças. Isso nos preocupa, pois essa matéria vai tramitar em um Congresso cujas bancadas ruralista, evangélica e da bala tem grande interesse e participação na construção da pauta", afirma o técnico.
Aprovada na administração da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), a Lei 13.260/2016, conhecida como Lei Antiterrorismo foi bastante problematizada à época. Pelo texto, a legislação diz que terrorismo consiste na prática de atos motivados por "xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião, quando cometidos com a finalidade de provocar terror social ou generalizado, expondo a perigo pessoa, patrimônio, a paz pública ou a incolumidade pública".
Nesta tipificação criminal, quebrar uma vidraça ou fazer uma pichação seria considerado vandalismo, com pena de reclusão de seis meses. Na nova proposta, esses atos podem ser tipificados como terrorismo e a pessoa pode pegar uma pena de até 30 anos de reclusão.
Outra matéria que merece atenção endurece penas aos cidadãos e alivia punições a policiais que cometem excessos em exercício de suas funções. Pela proposta apresentada, em situação de flagrante, "a autoridade policial deixa de efetuar a prisão se entender que o profissional de segurança pública praticou o fato amparado por qualquer excludente de ilicitude ou culpabilidade", diz o comunicado do Ministério da Justiça.
O dito "excludente de ilicitude ou culpabilidade" prevê que o agente de segurança pública não seja punido caso cometa um excesso "em vista de um temor fundado de risco grave e iminente". Isso quer dizer que o agente não seria penalizado caso, mesmo sem existir um ato criminoso acontecendo explicitamente, ele agisse com violência, chegando, inclusive, a cometer um crime, como um homicídio.
Segundo o advogado criminalista Vanter Coutinho, o projeto prevê ainda uma mudança no direito à defesa. "Quando se está repelindo uma agressão por legítima defesa, o agente é punido pelos excessos que ele comete, mas a matéria exige comprovação de intenção de matar ou ferir, o que dificulda muito a responsabilização de policiais pelos seus atos", afirma.
O especialista reitera que já está previsto no Código Penal que agentes de segurança pública podem agir em legítima defesa para proteger a si e a terceiros, o que bastaria para resguardar a sua integridade. Segundo ele, esta medida foi resgatada do Pacote Anticrime, proposto pelo então ministro da Justiça, Sérgio Moro, e que não foi aprovado pelo Congresso em 2019.
Os profissionais declararam que esta movimentação de Bolsonaro é uma sinalização para a base política do presidente. Para eles, em um governo que aposta no fortalecimento da sociedade civil armada e no conflito com os governos estaduais, fica evidente que as políticas não são protetivas, os opositores serão aqueles classificados como inimigos do Estado.
"Na verdade, Bolsonaro está apostando na criação de conflitos entre as polícias e os governos estaduais. É um ano eleitoral, então, caso ele venha a perder as eleições, o presidente já está formando aliados para fazer esse enfrentamento", observaram.
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